O Fim de Uma Trajetória Criminosa e o Início da Controvérsia
O sistema prisional do Rio de Janeiro registrou a morte de um de seus mais notórios detentos. Avelino Gonçalves de Lima, de 54 anos, conhecido como “Alvinho”, faleceu na semana passada, vítima de um câncer em estágio avançado. Condenado a 46 anos de prisão por crimes graves como homicídio, roubo e estupro, Alvinho era apontado como o líder da facção criminosa “Povo de Israel”. Sua morte, no entanto, veio acompanhada de uma forte polêmica e graves acusações de sua defesa contra o Judiciário.
Avelino estava internado no Hospital Clínica Grajaú, na Zona Norte do Rio, quando veio a óbito na última quinta-feira, 22 de agosto. Seu corpo foi sepultado no dia seguinte, no Cemitério de Irajá. O que transformou a morte do traficante em um caso de repercussão foi a alegação da defesa de que ele não teria recebido o tratamento médico adequado.
A Luta por Tratamento e as Negativas Judiciais
A batalha legal pela vida de Alvinho começou no início do ano, quando ele foi diagnosticado com um câncer em fase de metástase, com o tumor já espalhado para os pulmões, fígado e intestino. Diante do quadro de extrema gravidade, a advogada Flávia Fróes iniciou uma série de petições junto à Vara de Execuções Penais (VEP) do Rio de Janeiro. Segundo ela, foram 18 pedidos formais, todos negados, que solicitavam a concessão de prisão domiciliar ou a internação hospitalar para que o tratamento de saúde pudesse ser iniciado.
A defesa de Alvinho argumenta que as recusas do Judiciário foram baseadas na justificativa de que o sistema prisional teria capacidade para fornecer o atendimento necessário. Em uma declaração contundente, a advogada expressou sua indignação: “Pedimos domiciliar pra ele se tratar, foi negada. Pedimos durante todos esses meses internação pra iniciar tratamento, o juiz negou repetidas vezes. Ignorou os pareceres médicos.” Ela concluiu que a situação precisa ser denunciada em todos os órgãos de direitos humanos para que não se repita com outros presos, “seja quem for”.
Versões Conflitantes e Decisões Judiciais
O Tribunal de Justiça (TJ) do Rio de Janeiro se manifestou por meio de nota oficial, defendendo que a Vara de Execuções Penais “seguiu todos os trâmites legais na tramitação do processo”. A nota afirma que, em determinado momento, a VEP chegou a autorizar a internação de Avelino em uma unidade hospitalar indicada pela família, bem como a retirada das algemas após um relatório médico confirmar o diagnóstico. O TJ ressaltou que a defesa teve acesso a todas as decisões, que foram, segundo o órgão, acompanhadas e ratificadas pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.
No entanto, a defesa de Alvinho sustenta uma versão diferente. Em uma petição de extinção de punibilidade por morte, protocolada em 21 de agosto, eles tecem fortes críticas ao Judiciário. O documento alega que Avelino “experimentou suplícios e sofrimento não previstos no ordenamento jurídico pátrio por omissão imprópria judicial” e faz uma dura comparação da negligência médica no sistema prisional à medicina praticada em campos de concentração nazistas. A petição ainda afirma que, mesmo após uma decisão liminar do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) reconhecendo a urgência do tratamento, o criminoso foi “devolvido” ao seu estado de origem, onde os pedidos de sua defesa foram “ignorados”.
Próximos Passos: Justiça e Direitos Humanos
A advogada Flávia Fróes anunciou que levará o caso para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA). A petição da defesa critica a atuação do Judiciário, afirmando que a pena, nesse caso, “se transmuta em sentença de extermínio” e que “o Estado revela, em sua nudez, que não pune: executa”.
Enquanto a polêmica sobre o tratamento de Alvinho ganha força, é importante relembrar sua trajetória criminal. O traficante foi preso pela primeira vez em julho de 1999, acumulando 9 anotações criminais e 13 processos disciplinares. Em 2007, ele obteve um benefício para Visita Periódica Familiar (VPF), mas não retornou, sendo recapturado dois anos depois. Em 2023, chegou a ser transferido para o sistema penitenciário federal, mas retornou ao Rio de Janeiro em agosto do mesmo ano, sendo encaminhado para a Cadeia Pública José Antônio de Costa Barros.
Alvinho também era acusado de ordenar uma rebelião em 2018 que resultou na morte de um detento, em retaliação à sua transferência. A Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) também investigava seu possível envolvimento nas mortes de dois presos enforcados em 2022, que teriam sido assassinados por ordens dele após planejarem o sequestro da filha de uma liderança do “Povo de Israel”.
Conclusão
A morte de Alvinho, chefe da facção “Povo de Israel”, levanta questões importantes e complexas sobre os limites da punição e os direitos básicos de saúde no sistema prisional. A polêmica em torno das negativas judiciais para o tratamento de seu câncer grave ressalta a tensão entre a segurança pública e o direito à dignidade humana, mesmo para criminosos de alta periculosidade. A decisão da defesa de buscar órgãos nacionais e internacionais de direitos humanos coloca em xeque a atuação do Judiciário e levanta a necessidade de um debate mais aprofundado sobre a assistência médica dentro das prisões.
Com informações do site: G1
